BALADA DA RESSUREIÇÃO
Ciro José Tavares
“ir aos poucos subindo, subindo
Até encontrar a boca
E escutar num arpejo o universo parar
Na síncope de um beijo.”
Menotti Del Picchia, in Máscaras
Ressuscitar, mulher, é redescobrir o amor.
Primeiro abraço apertado partindo a lâmina de gelo
Que afoga receios e abre algemas do passado.
Depois deixar que livres, mãos pousem no teu colo
e despida a blusa dedos agitados corram
nos teus seios como rios caudalosos.
Estarás pronta, afinal, para sentir
no teu corpo o calor do amado que te cobre
entre beijos loucos e gemidos vindos da garganta.
Não escutarás sequer as palavras incompreensíveis
Atropeladas pelas nossas vozes convulsivas.
Mas eu ouvirei teu grito lancinante
no momento do encontro do êxtase divino,
e no silêncio posterior o compasso da respiração.
Como lençol diáfano a paz virá sobre teu leito
Para embalar o sono construindo, sonhos
Fênix renascida, mulher redescoberta.
***
VOLTANDO
Daisy Maria Gonçalves Leite
Ontem...
Voltei ao passado
Cantei e escutei cantar
Versos que lá estavam guardados
Foi como se estes dez anos
Não nos houvessem separados
Vasculhei todas lembranças
No baú das minhas recordações
Com os olhos marejando de lágrimas
Curvei-me ante o altar
Das minhas ilusões
Baixinho, bem baixinho murmurei
Sou eu, eu que estou voltando
Venho buscar mais uma ilusão
Pois continuo amando!...
***
Trama
JANIA SOUZA
Na boca da noite
o vulto do tempo
impõe seus dogmas.
Senhor feudal do universo
tiraniza a vassalagem humana
subjugando-a com invisíveis grilhões
que acorrentam fortemente a verdade,
esposa dedicada
da sabedoria, viajante anelada
nas asas da esperança.
Na boca da noite
o vulto do tempo
descobre-se... e encobre-se
feito gatuno sorrateiro
funde-se na escuridão
violando-a cinicamente
ao embrenhar-se no manto
da silenciosa noite.
Talvez, seu intuito seja o de fingir
que não intervém no círculo vicioso
do poder, que emana
da fétida escória humana...
Na boca da noite
o vulto do tempo.
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