quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Revivendo Veríssimo de Melo



Lembro-me bem, como se hoje fosse! Caminhávamos pelo Grande-Ponto, quando se encontraram o meu tio-sogro Enoir Botelho e o escritor Veríssimo de Melo, em uma manhã ensolarada de verão pleno. Foi uma festa! Abraços, cumprimentos guardados no tempo e no espaço. É que, Enoir, como Veríssimo, foram jogadores de futebol na juventude, justamente na fase em que o chamado esporte bretão estava nos seus primórdios aqui na terrinha. O primeiro, foi embora para servir à Marinha do Brasil, ausentando-se da cidade por muito tempo, enquanto Vivi postara-se sempre, e permanentemente, em Natal, ao lado dos fandangos, dos pastoris, das lapinhas, dos maracatus, dos bumba-meu-boi, das cheganças, dos cocos de roda, das rendeiras, das benzedeiras, dos cantadores de viola, dos cordelistas, de Djalma Maranhão, de Câmara Cascudo, de Newton Navarro, de Zé Areia, do jornalismo telúrico, eis que, naquela época, escrevia uma coluna no Diário de Natal, que retratava o cotidiano potiguar, suas figuras humanas com cheiro de maresia e da brisa do Rio Potengi. Assisti, ao lado de Marta, prima que se tornou minha mulher, todo o desfilar de emoções incontidas propiciadas pelos dois amigos de antanho. Relembraram, ali mesmo, naquele instante matinal de 1956, todo um passado ido e vivido, repleto de reminiscência juvenil, recheado de velhos sonhos e conjecturas. Veríssimo lembrava os tímidos namoros, as primeiras serenatas ao luar, as tênues manifestações intelectuais, os primeiros versos, as travessias a nado para a Redinha. Enoir, seu companheiro de andanças e peladas de futebol, a tudo ouvia e confirmava tudo, especialmente as relembranças de Natal das décadas de 30/40, como se o tempo tivesse parado para ambos, naquele momento. E foi justamente, a partir desse diálogo de eternal felicidade, que passei a conhecer, admirar e a acompanhar a obra de Veríssimo de Melo. Assim destaquei o Vivi folclorista, o professor de etnografia, de filosofia, de antropologia cultural, o diretor do Museu Câmara Cascudo, o presidente do Conselho Estadual de Cultura, o membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras. Pude captar, com o transcorrer do tempo, a sua luta em prol do desenvolvimento da cultura popular – desde aquela época tão relegada a plano secundário – carente de apoio e de incentivo oficial. Mesmo assim, qual um desbravador ou como um espadachim aguerrido, Veríssimo de Melo não se entregava ao desânimo e lutava e lutava... Os anos passavam e ele crescia. Crescia na literatura, na admiração do povo e alicerçava a sua magnífica obra. E tantos foram os livros, e tantas foram as noites de pesquisas, que o homem nos legou um trabalho literário do melhor quilate, da maior repercussão para as gerações futuras. É notório que esse esforço veio beneficiar a todos, porquanto nos brindou com uma vasta produção intelectual, representada pelos seguintes livros: Adivinhas (1948); Acalantos (1949); Parlendas (1949); Rondas Infantis Brasileiras (1953); Jogos Populares do Brasil (1956); Gestos Populares (1960); Cantador de viola (1961); Folcrore Infantil (1965); Ensaios de Antropologia Brasileira (1973); O Conto Folclórico no Brasil (1976); Folclore Brasileiro: Rio Grande do Norte (1978); Tancredo Neves na literatura de Cordel (1986); Medicina Popular no Mundo em Transformação (1996); em 2007 foi editado pelo Sebo Vermelho, a obra póstuma Natal há 100 anos passados, entre outros títulos, permitindo, dessa forma, que os mais novos, os construtores do Brasil de hoje e do futuro, possam cultivar o gosto pela cultura popular, base essencial para a memória de um povo. Em boa hora, a FUNCARTE, sob a tutela do seu valoroso Presidente, Prof. Roberto Lima (que está no lugar certo) fez promover o Seminário Viva Vivi, que além de muito concorrido, contou com a participação de intelectuais da terra e de pessoas compromissadas com o folclore potiguar, que é muito rico, por sinal. Estamos convictos de que a obra e o legado deixado pelo eminente conterrâneo servirá de base às próximas gerações, para a preservação dos costumes e das tradições do nosso povo. Viva, Vivi!


Odúlio Botelho Medeiros – Vice-presidente da ALEJURN – Do IHGRN

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