quarta-feira, 29 de agosto de 2012

DIONÍZIO DE APODI DEFENDE CULTURA MOSSOROENSE

                                                                 DIONÍZIO DE APODI
                                                                                 ATOR

Dionízio do Apodi é um artista abnegado e comprometido com arte em Mossoró, jovem idealista que há mais de uma década milita no movimento cultural do município. Conhece como poucos as entranhas da cultura de Mossoró e a realidade dos artistas da terra. Nesta entrevista, expõe seu ponto de vista sobre o cenário cultural da cidade, de forma sincera e sem amarras. Em alguns trechos, desabafo contra injustiças aos artistas. Em outros, grito por justiça aos fazedores de cultura e repúdio a fantasias impostas como verdade.
Por Maricelio Almeida
maricelio_almeida@hotmail.com.

O MOSSOROENSE – O senhor participou, recentemente, de um protesto que fez o sepultamento simbólico do Museu Lauro da Escóssia e do Teatro Lauro Monte Filho. O que levou os artistas a fazerem essa mobilização e qual o objetivo da iniciativa?
DIONÍZIO DO APODI
– Nós elegemos o Museu Lauro da Escóssia como símbolo do descaso do poder municipal para com a nossa cultura, e o Teatro Lauro Monte como símbolo do descaso do Governo do Estado também para com a nossa cultura. Os dois monumentos são símbolos de nossa luta, o que significa dizer que não queremos apenas os dois funcionando, mas temos outra série de reivindicações no plano municipal, estadual e federal também. O Museu não funciona desde o ano 2000 e de lá para cá, se alguém pegar os jornais que contam esta história, verá que quase todo ano temos notícias de que a Prefeitura está organizando o seu retorno, mas na prática continua fechado. O Teatro Lauro Monte Filho está fechado desde 2008, entregue aos morcegos e aos pombos. Na verdade estes equipamentos já morreram faz tempo, porque não estão servindo à população. Mas aconselho a população a ler o nosso manifesto, que está sendo propagado em todo o Brasil, através do endereço www.manifestoartistasmossoro.blogspot.com.br. A leitura simples já esclarece muita coisa, pois no manifesto expomos o que queremos e o que não queremos em todos os planos (municipal, estadual e federal).
DA – Somos a favor da escola. Nunca fomos contra. Mas sabemos que foi pego uma escola comum, dado uma mão de tinta, deixado bonitinha para impressionar, mas ela não passa da velha Escola Municipal que existia por lá. A Prefeitura de Mossoró deveria encarar a cultura com seriedade e parar de fazer remendo. Essa escola não dispõe dos equipamentos necessários para funcionar como Escola de Artes. O povo vê aquela gritaria que fizeram, com direito a discurso de Stênio Garcia (que merece todo o nosso respeito, mas que veio com cachê pago) e fica achando a coisa mais bonita do mundo o que temos por lá. Você é jornalista e sabe o que é necessário para que o seu jornal seja impresso (pauta, repórter, redação, correção, diagramação, e por aí vai até a impressão e distribuição). Eu como artista sei o que se precisa ter para uma sala de teatro, para uma sala de música, para uma sala de dança. E nessa escola falta muita coisa. Dizer que não vai funcionar eu não sou besta de dizer isso, pois lá tem pessoas preparadas que sabem tirar leite de pedras, como sempre fizeram em seus grupos artísticos. Mas os artistas de Mossoró se acostumaram a receber coisas pela metade. O pior é que para completar depois, perde-se o argumento, pois o leigo não entenderá sobre o que estamos falando, e apontará sempre como o povo que 'reclama de barriga cheia'.

DA
– Nosso patrimônio histórico está sendo destruído. A história de Mossoró está sendo derrubada pela ignorância de nossos gestores e de nossa Câmara Municipal, que não grita. Os vereadores, como representantes do povo, também deveriam impedir, independente de partido ou tendência. Quantos prédios históricos foram derrubados para nada. No centro de Mossoró, havia o famoso castelinho, que foi derrubado para nada, pois é o que tem no lugar onde ele estava: nada, um terreno vazio. O antigo Grande Hotel, o Cine Caiçara e tantos outros que a cada semana se apagam de nossa vista. A capela do Bom Jesus está se destruindo, nossa ponte de ferro que poderia ser roteiro turístico. Como é que uma cidade que teve pretensão de ser capital da cultura faz isso com sua história arquitetônica? Nós temos aqui perto Aracati, no Ceará, que manteve a sua arquitetura através de tombamento, e já são inúmeros filmes que foram rodados por lá, devido à sua arquitetura antiga. Se continuarmos nesta ignorância, destruindo nosso patrimônio, vai nos restar apenas a Cidadela do Mossoró Cidade Junina.
OM – Mossoró tem um dos melhores teatros do Norte/Nordeste, que é o Dix-huit Rosado. Esse equipamento é bem utilizado?
DA
– O Teatro Dix-huit Rosado tem uma programação regular, e isso é bom. Mas digo que o artista mossoroense ainda não ocupou aquele espaço como deveria. O Teatro Municipal Dix-huit Rosado, como o Teatro Estadual Lauro Monte Filho e os demais equipamentos públicos, deveria ser entregue aos artistas, para que estes pudessem ocupar e desenvolver de forma plena as suas ações. Não se trata de você pegar um dia ou outro no teatro e fazer uma apresentação. Me refiro a ocupação, a salas sendo utilizadas pelos grupos, camarins que pudessem se tornar também espaços de experimentação cênica. Que tivéssemos ações de formação de plateia, e não o que acontece hoje. O Teatro Dix-huit Rosado existe há anos e mesmo assim aquele teatro ainda não tem um público cativo como tem os grandes teatros do Brasil. Em São Paulo e Rio de Janeiro nós temos públicos para aqueles teatros. Você vai a determinado teatro porque sabe que ali tem boas peças. Aqui em Mossoró, a pauta é praticamente toda empregada em espetáculos imbecis, que nada acrescentam para Mossoró, a não ser imprimir a falta de educação e o péssimo gosto teatral. No Teatro Dix-huit, com algumas exceções, temos público para artistas da Globo ou besteiras que vivem o seu momento de fama. Teatro é diferente. Quando vamos apresentar uma de nossas peças em algum espaço em São Paulo ou no Rio de Janeiro passamos por uma seleção. Aqui em Mossoró qualquer besta vindo daquele eixo ocupa a pauta para exibir bestialidades. A direção do Teatro Dix-huit deveria tratar o povo de Mossoró com mais carinho, selecionando os espetáculos que ali são apresentados, através de edital mesmo. Em todos os espaços são assim, menos em Mossoró. Um tempo desse inventaram um projeto para os 'artistas da terra' intitulado terça nossa (acho que era assim o nome), onde os grupos de Mossoró recebiam as pautas livres para apresentar seus espetáculos. Aí eu pergunto: por que não fizeram isso no sábado. Este teatro é nosso e a prioridade deve ser a nossa. Mas infelizmente o artista de Mossoró tem se acostumado a se alimentar das sobras que caem da mesa, e não por completo, sentado à mesa, que não percebe que é dele o lugar.
OM – Para finalizar, o que o próximo prefeito ou prefeita de Mossoró precisa fazer para elevar a cultura local ao patamar que merece?
DA
– A primeira coisa que deve fazer é estabelecer diálogo, ouvir o que queremos e se esforçar para atender as reivindicações. Ter uma equipe preparada para receber críticas também, e não achar que é pessoal o simples fato de algum artista discordar. Isso já é um grande passo. Dessa forma, será possível saber que precisamos priorizar investimentos nos artistas e grupos; que precisamos ocupar todos os espaços públicos que a arte possa ter acesso; que precisamos que o acesso aos recursos públicos seja através de edital; que precisamos tratar os pagamentos dos artistas mossoroenses da mesma forma que tratam as bandas que vêm tocar no Cidade Junina (elas não esperam cinco meses para receber); que precisamos aumentar e garantir os recursos do Prêmio Fomento anualmente; que precisamos de editais para escolha dos diretores dos autos mossoroenses; que precisamos fazer investimentos nos bairros de Mossoró, construindo equipamentos que nesta gestão foram construindo apenas na avenida Rio Branco. A cultura de Mossoró não deve ser num corredor, mas no município inteiro. Ampla, e não restrita.

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