Feitiço do tempo
(*) Rinaldo Barros
A conversa de hoje segue o rumo das
inquietações e perplexidade em relação à irrealidade do nosso mundo
contemporâneo. Ando angustiado porque tenho um entendimento
de que, neste início de Milênio, não estamos atravessando apenas mais um
momento de turbulência. Estamos dentro do olho do furacão.
Uma perplexidade que, espero, não
seja somente minha, mas de todos os que ainda almejam construir a cidadania e
vivem as dificuldades para manter a dignidade e colocar em prática os valores
civilizatórios.
Estou cada vez mais convicto de que
a sociedade, acuada pela insegurança física e moral, desaba diante dos olhos de
um Estado cada vez mais fraco, da impunidade que beira à anomia (pode ir ao
dicionário), e de práticas indecentes disseminadas por todas as classes e
segmentos sociais.
Lamento informar, mas estamos num
mundo volúvel e volátil pautado pelos caprichos do capital financeiro, sem
pátria, sem regras e sem lei que o regule. Um mundo que gira como uma roleta, como
uma banca de apostas onde o único valor é o lucro fácil, sem qualquer
compromisso com o desenvolvimento das sociedades.
Recentemente, encontrei respaldo
para minhas suspeitas no sociólogo polonês Zygmunt Bauman, em seu livro “Tiempos
Líquidos”, Tusquets editores, México, 2008. Bauman me ajudou a entender melhor
esse nosso tempo sem raízes, sem memória, através um conjunto de análises que
ajudam a elucidar esses descaminhos.
Aprendi que a modernidade resultou
da fragmentação do que antes era sólido.
Bauman aponta cinco pontos
representativos dessa mudança de curso, sem precedentes na história da
humanidade.
1)
Desmantelamento
das organizações sociais - a velocidade das alterações ocorridas nas
organizações sociais fez com que estas não mais consigam manter seu formato e
se dissolvem rapidamente. O controle social se desmancha gradativamente, em
marcha acelerada.
2)
Fragmentação
do Estado moderno - o poder antes era circunscrito ao Estado de cada nação. Hoje,
o poder é globalizado e se afasta na direção de um espaço global, planetária;
mas - contraditoriamente - o poder local continua sendo exercido em cada lugar,
de forma fragmentada, pulverizada, desarticulada. O Estado nacional tende a se
tornar impotente frente às grandes questões sociais e econômicas.
3)
O
mercado substitui as relações sociais - a comunidade, como forma de se referir
à totalidade da população que habita um território soberano, perde substância e
significado. Os laços inter-humanos se tornam cada vez mais frágeis e
descartáveis porque são regulados pelas leis do deus-mercado. A exposição e
submissão das pessoas aos caprichos dos mercados de força de trabalho, de
mercadorias e de serviços inspiram e promovem a divisão do trabalho, a
competição e o individualismo; em detrimento da colaboração, da cooperação e do
trabalho em equipe.
4)
Colapso
do pensamento - estão cada vez mais relegados ao segundo plano o pensamento
formulador, o planejamento e as ações de longo prazo, do que resulta o
enfraquecimento das estruturas sociais; e coloca em risco a construção do
desenvolvimento sustentável. Dessa forma, a vida fica fragmentada, sem
continuidade histórica. O conhecimento do passado não assegura a probabilidade
de vitórias futuras. Na correria cotidiana, não há tempo para reflexões ou
novas construções teóricas; não se planeja e não se tem noção para onde estamos
caminhando.
5)
Desequilíbrios
da economia global - metade do comércio mundial e mais da metade do
investimento global beneficiam apenas 22 países, os quais acomodam apenas14 por
cento da população mundial. 90 por cento da riqueza total do planeta estão nas
mãos de apenas (01) hum por cento de seus habitantes. E não há qualquer
instrumento ou mecanismo à vista capaz de deter essa maré global de polarização
entre o poder e a riqueza, de um lado, e a crescente miséria material e
espiritual, na ponta dos famélicos esquecidos.
Pelo andar da
carruagem, as consequências desta globalização imperialista são e serão
desastrosas, pois o que se vê é a concentração de riquezas e de poder, ao lado
do crescimento do desemprego, da miséria, da exclusão social, e da violência
urbana, com drogas e criminalidade crescentes.
Ingenuamente, talvez,
como queria Agostinho (354 a 430 d.C), só me resta continuar com a Esperança,
ao lado de suas duas filhas lindas, a Indignação e a Coragem; ainda uma vez
mais, com a única arma que possuo - a palavra - gritando para tentar construir
um mundo melhor.
(*)
Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com
O SITE AGORA OFERECE CURSOS 24 HORAS, COM CERTIFICADO.
ATUALIZE SEUS CONHECIMENTOS
http://opiniaopolitica.com/
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Teremos o maior prazer em receber seu comentário.