ESTENDER
AS MÃOS
Públio José – jornalista
O dicionário tem a mão como órgão terminal do braço e de fundamental importância
para a sobrevivência e desenvolvimento do homem no decorrer da sua história. A
mão é também um dos principais órgãos do corpo humano pela sua agilidade e
utilidade para segurar, tatear e efetuar todo tipo de trabalho. Além disso, a
mão tem servido, através dos tempos, de símbolo a todo tipo de ato, gesto e
expressão com as mais diversas finalidades. A literatura mundial, por sua vez,
tem designado à mão uma série infindável de funções e atribuições dentro do
contexto de dramaticidade e simbologia exigidas na construção dos mais diversos
personagens. No teatro, por exemplo, o texto flui com mais naturalidade na
medida em que o intérprete faz bom uso das mãos. Na escrita nem precisa se
ressaltar o seu valor fundamental. Enfim, a mão é o membro mais utilizado entre
todos os que compõem o corpo humano.
São também notórios os significados dos inúmeros gestos que envolvem as mãos e
o que têm representado ao longo da história. Na antiguidade – e ainda
hoje em comunidades mais tradicionais – elas falam por si. E, sem a
necessidade de palavras, emitem os mais diferentes sinais. A lavagem das mãos,
por exemplo, era sinal de inocência; segurar a mão direita de alguém
significava dar-lhe apoio; postar-se à mão direita de outro era convencionado
como dar proteção ou receber honra e poder da parte da pessoa ao lado;
apoiar-se na mão de alguém consignava demonstração de familiaridade ou de
superioridade; dar a mão à outra pessoa assumia postura de submissão; derramar
água nas mãos do outro indicava serviço prestado; beijar a mão de alguém
significava gesto de homenagem, respeito e reverente submissão; decepar a mão
tinha a finalidade de expressar um notável gesto de autoflagelação...
A mão aberta já indicava sentimento de generosidade, enquanto a mão fechada
representava sinal de mesquinhez; o polegar voltado para cima significava
aprovação e o contrário, o polegar para baixo, desaprovação. São incontáveis,
enfim, as maneiras, modos e tipos de utilização que o homem tem encontrado para
as mãos no transcorrer do tempo. Entretanto, no tocante ao relacionamento
humano, um dos atos mais nobres e marcantes ligados às mãos é o de estendê-las
em direção a alguém. Significa uma postura de total envolvimento nas carências
do outro, revertendo, em favor do próximo, ações que envolvem solidariedade,
proteção, misericórdia, fraternidade, compaixão. Estender as mãos é um gesto de
importância transcendental. Que, em determinados momentos, na vida de alguém,
pode significar o estabelecimento da diferença entre as alegres cores da vida e
o triste negrume da morte.
Entre o calmo remanso de paz e as ondas encapeladas do desespero, da aflição,
da angústia. Por sinal, nos dias atuais, vê-se a humanidade dividida entre dois
tipos de pessoas: as que (ainda) sabem estendê-las em benefício de alguém e as
demais. Estas, embutidas num casulo de egoísmo, egocentrismo e individualidade,
se negam a dar às suas mãos uma das missões mais nobres e prazerosas existentes
no contexto da convivência entre os homens. Já aquelas dispostas a estender
suas mãos estão, em vida, duplamente beneficiadas. Em primeiro lugar, pelo fato
de viverem a condição de fazer pelo próximo – e não de receber (o outro,
ao contrário, se vê inferiorizado na desconfortável posição de ser ajudado). E
também pela constatação de que, ao estender as mãos ao necessitado, têm o
coração povoado por nobres motivações e pelo mais puro sentimento: o do amor.
Sacou? Estender as mãos... Ah, que bela empreitada!
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