quarta-feira, 12 de junho de 2013

MIA COUTO

                                Escritor Mia Couto
                     partilha prêmio Camões 
                       com povo moçambicano

Ao participar de cerimônia em Lisboa, manifestou desejo de tornar comunidade lusófona mais viva para celebrar língua em comum

O escritor moçambicano Mia Couto (foto), que recebeu o Prêmio Camões de literatura na noite desta segunda-feira (10/06), no Palácio da Queluz, em Lisboa, decidiu não dedicar, mas partilhá-lo com todo o povo de seu país.

"Partilho este momento com a gente anônima de Moçambique, essa multidão que fabrica a nação viva e sonhadora que venho celebrando desde há mais de 30 anos", disse Mia, após ter recebido o prêmio das mãos dos presidentes de Portugal, Cavaco Silva, e do Brasil, Dilma Rousseff, numa cerimônia realizada no Palácio de Queluz.

"Pensamos que um prêmio serve para celebrar o que já fizemos. Prefiro pensar que se trata de celebrar o que há ainda por fazer, e quanto nos falta realizar a todos nós para que seja mais viva e mais verdadeira esta família que celebramos na nossa língua comum", afirmou Mia.

O escritor também compartilhou a premiação com familiares e amigos, com o seu editor, Zeferino Coelho, e em especial com o seu pai, Fernando Couto, que morreu este ano.


“Foi ele que me ensinou, não apenas a escrever poemas, mas a viver em poesia. Este prêmio pertence a esse sentimento do mundo que ele me legou como uma sombra, que resta mesmo depois de tombar a última árvore”, disse.


O presidente de Portugal, Cavaco Silva, considerou  que a atribuição do Prêmio Camões a Mia Couto foi uma decisão "justa e clarividente" e elogiou a "imensa originalidade" do seu universo ficcional.

Na cerimônia, o chefe de Estado português agradeceu Dilma por visitar o país e participar da cerimônia exatamente no dia 10 de junho.  “O seu gesto, senhora presidente, tem um significado muito especial, que quero sublinhar, porque ocorre no Dia de Portugal, que é também o Dia de Camões, a data em que celebramos o universalismo da Língua Portuguesa. Na verdade, é um traço de união que celebramos neste Dia de Portugal e das Comunidades Portuguesas”.

“Felicito, com afetuosa admiração, o escritor Mia Couto, bem como o júri que decidiu atribuir-lhe este galardão. Foi uma decisão justa e clarividente”, acrescentou.

Cavaco Silva referiu-se a Mia Couto como “um dos mais reconhecidos e versáteis autores da lusofonia contemporânea”, que “construiu, ao longo de uma sólida carreira, um universo ficcional próprio, de imensa originalidade, que se singulariza por confrontar as suas personagens - e também os seus leitores - com as grandes interrogações e os grandes dilemas da existência humana”.

O presidente português disse que “Mia Couto reconstrói o tempo e o modo moçambicanos, as tradições e a oralidade da sua terra natal, aquela que foi terra sonâmbula e hoje constitui um dos países mais promissores do continente africano”.

Já Dilma disse que a obra de Mia Couto permite “descobrir a África”, viajar pelo interior de Moçambique, viver o “burburinho de Maputo” e emocionar-se com “histórias singulares, mas universais”.

 
Publicado em Opera Mundi – 11/6/2013

Mia Couto: ativismo político também é feito com literatura
Poeta, jornalista e biólogo moçambicano participou da luta pela independência de seu país
Por Viviane de Paula/Blog Colecionador de Pedras
Amantes da poesia lotaram o Bar do Zé Batidão, na zona sul, para acompanhar a conversa com Mia Couto e o sarau da Cooperifa

Sob a laje de um sobrado no Jardim São Luís, bairro de periferia na zona Sul de São Paulo, mais de cem pessoas se acomodavam para escutar atentamente e com confesso deslumbramento uma palestra informal do poeta, biólogo e jornalista moçambicano Mia Couto, autor de obras como “Terra Sonâmbula” (Cia. Das Letras, 1992 (1ª ed.), 208 pgs.), de passagem pelo Brasil para a divulgação de seu mais recente livro, “A Confissão da Leoa” (Cia das Letras, 2012, 256 pgs.).

Em meio aos populares do Bar do Zé Batidão, onde ainda participou de um sarau organizado pelo coletivo
Cooperifa, na última quarta-feira (07/11), Mia parecia mais à vontade do que no dia anterior, quando conversou amigavelmente com um público mais elitizado, em uma sala de cinema do Conjunto Nacional, localizado nos Jardins, bairro ‘nobre’ da zona oeste. Nas duas ocasiões, conversou com a reportagem de Opera Mundi.

O perfil pacato e conciliador do escritor não esconde uma vida marcada pela militância, que começou nos anos 1970, quando participou da luta pela independência de Moçambique, quando se juntou à Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique). Hoje, desencantado, não participa mais da vida político-partidária do país (promete nunca mais voltar a se envolver com partidos), mas o ativismo está presente em suas atividades como jornalista, biólogo (dirige uma empresa de estudos sobre impactos ambientais) e, sem dúvida, em suas obras.

Ativismo político

“Política é um assunto tão sério que não pode ser deixado só nas mãos dos políticos. Temos de reinventar uma maneira de fazer política, porque isso afeta a nós todos. Faço isso pela via da escrita, da literatura, já que me mantenho jornalista e colaboro com jornais. Também faço intervenções como visitar bairros pobres onde as pessoas não recebem meu tipo de mensagem. Essa é a minha militância”, explica.

Atualmente, afirma manter uma distância crítica do governo, controlado pela Frelimo desde a independência, em 1975. Para ele, a proximidade entre o discurso e a prática do partido se distanciaram, mas afirma não haver ressentimento ou sensação de traição, pois considera que esse fenômeno se reproduz em todo o mundo. Ao contrário, se diz grato por seu tempo de militância partidária. “Fazer política hoje exige grande criatividade, temos de saltar fora de modelos, mas o modelo de fazer política faliu. Em todo o lado do mundo. Então é preciso reinventar, ter imaginação. Para ter imaginação é preciso sair fora dos padrões que vemos”.

Nascido António Emílio Leite Couto, filho de um casal de portugueses que já viviam há muitos anos no país africano, Mia cresceu em uma casa colonial na Beira, terceira maior cidade de Moçambique, em um meio rural e próximo do ambiente místico encontrado em algumas de suas histórias


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