sexta-feira, 14 de março de 2014

Violência e desigualdade brutal


“Algo está muito mal quando as pessoas de boa vontade consideram que, para viver em paz, é preciso estar armado.”
(Sen. Cristovam Buarque)
(*) Rinaldo Barros
O cenário de terror que circunda esta reflexão é a invasão de comunidades pobres pelas forças de segurança, produzindo, dia após dia, civis e policiais feridos e mortos; ônibus, carros e motos incendiados, milhares de disparos de fuzis e pistolas, explosões, e centenas de corpos estendidos no chão, a cada dia.
A conversa de hoje é, em verdade, um olhar sobre a brutalidade da desigualdade, da pobreza, da miséria espiritual, e da violência intrínseca, cotidiana. Não falo da violência dos criminosos, que são o principal foco das ações policiais, mas da pobreza persistente da maioria da população, como causa e produto da desigualdade brutal.  
A pobreza, violenta em si, mata silenciosamente pela fome, pela desnutrição, pela ausência de cuidados básicos, pelos transtornos mentais, pela água contaminada, pelas endemias e pela epidemia de drogas, ilícitas ou não.
Mas é necessário reforçar que a desigualdade é a fonte de alimentação do caldo de violência que agride o país, com destaque para a epidemia do crack alterando a química do cérebro de milhões de crianças e jovens brasileiros.
Será que, além da construção dos estádios maravilhosos, ainda é possível reconhecer as feridas abertas, e exigir que as Políticas sociais se traduzam em investimentos prioritários em Segurança pública, lato sensu?
Entendo que os pobres são as primeiras vítimas da violência. A desigualdade lhes impõe uma situação de desamparo tamanho que, para além da violência latente na condição de carência, confrontada com o esbanjamento de recursos dos mais ricos e poderosos, ficam sem defesa alguma, e são impotentes contra a violência do seu dia-a-dia.
Na periferia, dominada por redes criminosas em razão da omissão do Estado, famílias inteiras convivem com o risco de desconstituição familiar, ameaças de morte de crianças e adolescentes, restrições no direito de ir e vir, parentes desaparecidos, entre outras violências inimagináveis e invisíveis aos olhos menos atentos.
A Segurança, como bem público, deveria ser garantida a todos os cidadãos. No entanto, historicamente, os pobres sempre foram (e continuam sendo) alijados desse direito, dentre outros tantos tão elementares para a constituição da cidadania. Hoje, com a luz amarela acesa, o medo é geral, porque ninguém se sente seguro.
As bolsas e cotas do PT governo não foram capazes de mudar o Brasil real para melhor, mas perpetuaram a desigualdade brutal, com a manutenção da dominação ideológica e do consumismo, via manipulação e propaganda mentirosa, em que pese a crescente banalização da vida. Só não ver quem não quer.
Ao PT governo, fiel preposto do agronegócio e dos bancos, e sem ter feito nenhuma reforma necessária à sociedade brasileira, só interessa as alianças que garantam vencer as próximas eleições; o Brasil que se exploda.
A cultura da violência, a certeza da impunidade e a indiferença da maioria da sociedade atestam que, no patropi, “a vida humana vale muito pouco”. Senão, vejamos.
Toda noite, centenas de milhares de brasileiros não conseguem dormir por falta de espaço. Eles sobrevivem em celas superlotadas, projetadas para três ou quatro pessoas, mas ocupadas por mais de 20. A maioria está doente e sofre de distúrbios mentais. São mal alimentados, violentados, e subjugados por organizações criminosas.
São jovens favelados, miseráveis, a maioria negros, (de 15 a 24 anos), muitos deles traficantes ou viciados.  
E, pasmem, estão sob a tutela do Estado.
Todo dia, centenas de brasileiros, presos ou sequestrados, são torturados asfixiados em sacos plásticos, submetidos a choques elétricos e espancados até a morte (vide Mapa da Violência - http://www.mapadaviolencia.org.br/; filmes “Tropa de elite 1 e 2” e Manual Prático do Ódio - Ferréz. ed. Objetiva).
Em 2012, de acordo com as estatísticas oficiais, em todo o Brasil, houve 50.108 casos de homicídios. A maioria deles com sinais inequívocos de execução. E esse número é crescente e preocupante.
Este é realmente o caminho para a solução?
O narcotráfico terá seu poder reduzido matando-se jovens pobres nas favelas?
O fato é que a pobreza foi enquadrada nas favelas e confinada nos chamados bairros periféricos das metrópoles (cerca de 50% da população do Rio de Janeiro e São Paulo moram em favelas ou em loteamentos ilegais; e mais de 10% da população de Natal - umas 100 mil pessoas - sobrevivem em favelas ou submoradias.  
O detalhe curioso é que os chefes do narcotráfico, milionários, não moram em favelas.
Pra concluir, desconfio que existe um forte componente cultural associado ao controle da violência e que este controle funciona melhor onde existe uma ética social; o que – lamentavelmente – não é o caso do Brasil.
Se esse raciocínio está correto, o problema da violência urbana, no patropi, tem um forte componente cultural e está associado ao fato de não termos uma tradição de respeito aos direitos e às liberdades individuais, e a nossa grande tolerância com a corrupção, com a transgressão, o tal “jeitinho brasileiro” visando “levar vantagem em tudo”.
Não há dúvida de que urge uma profunda reforma no nosso sistema prisional, e de controle mais rigoroso na execução penal (com a introdução do trabalho forçado como parte da pena); notadamente em relação aos chefes das organizações criminosas. O trabalho forçado para condenados, talvez, seja um caminho, uma solução.
Resumo da ópera: as feridas abertas pela desigualdade brutal nos alerta que Segurança pública não pode ser um projeto de governo nem de partido, mas do conjunto da sociedade, um projeto de Nação.

(*) Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com


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